“Ela quer roubar você de mim”, “Seu pai abandonou vocês”, “Sua mãe não se importa com você”, “Seu pai não dá dinheiro para manter vocês” essas são algumas das frases comumente ditas a crianças em meio a processos de divórcio e disputa de guarda, que exemplificam a prática da alienação parental. No último dia 17, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou um ato normativo que estabelece um protocolo para que crianças e adolescentes sejam ouvidos de forma especializada em ações de família envolvendo alienação parental. No Brasil, uma legislação sobre o tema existe desde 2010, buscando proteger os menores dos impactos emocionais dessa prática durante as separações.
A alienação parental envolve um tipo de manipulação psicológica em que um dos pais, ou outro familiar, tenta distorcer ou enfraquecer a relação da criança com o outro genitor. Segundo a advogada especialista em Direito das Famílias, Bárbara Heliodora, “alienação parental é um processo profundamente prejudicial, onde o genitor alienador tenta, por meio de falsas denúncias, críticas constantes e manipulações, afastar o outro genitor da vida da criança. Isso pode ter consequências devastadoras para o desenvolvimento emocional e psicológico da criança”.
Para o pai, G.T, que se divorciou há cerca de dois anos, viver uma situação de alienação parental foi doloroso: “Foi uma experiência muito ruim, angustiante e triste. Tanto para mim, mas principalmente para o meu filho, porque eu sempre tive contato com ele desde que nasceu. Nunca passei tanto tempo sem estar com ele. A mãe dele começou a afastá-lo por raiva, ódio, não sei quais são as justificativas dela, ela fazia isso e eu ficava sem saber o que fazer”, disse.
Inicialmente, G.T. relutou em entrar na justiça. Mas, quando a situação se agravou, percebeu que precisava de uma medida judicial. “Muitas vezes, eu e a mãe do meu filho combinávamos algo, como eu ficar com ele de segunda a quarta, e ela simplesmente desmarcava na última hora. Isso começou a se tornar constante, então entrei na justiça. Só que a justiça demora. Foram seis ou sete meses até termos uma audiência e uma decisão”, acrescentou o homem.
“Para mim, era tudo novo, uma novidade. Eu fiquei abalado, sem chão. Com o tempo, percebi que meu filho começou a mudar o comportamento. Meu filho se tornou mais medroso, mais retraído quando eu perguntava o que ele estava fazendo ou como ele estava. Ficava nítido que ele estava com receio, com medo, como se estivesse sendo protegido por outra pessoa. Ele até começou a mentir, algo que antes não fazia, repetindo coisas que claramente não vinham dele, como se fosse um papagaio. Era muito evidente que aquilo vinha da outra parte”, contou.
“Comecei a estudar sobre alienação parental e vi que muitos pais desistem porque é mais fácil. A justiça não é igual para os dois lados, e é mais simples pagar a pensão, ver o filho uma vez por mês e seguir com outra família. Mas essa responsabilidade é nossa. Meu filho é meu filho, e eu coloquei ele no mundo, então nunca vou desistir, por mais difícil que seja. Aprendi a focar mais na qualidade do tempo que passamos juntos do que na quantidade. Agora, eu me concentro em brincar com ele, conversar, contar histórias, muito mais do que fazia antes”, ressaltou o pai da criança.
A jovem B.B. tinha 3 anos de idade quando os pais se separaram, ela não entendia mas era vítima de alienação parental. Ela conta: “Meu pai arrumou um jeito de conseguir minha guarda sem minha mãe saber, e foi então que começou todo o problema. Quando minha mãe teve a guarda de volta, eu acabei me magoando bastante com meu pai, pelas coisas que ele falava da minha mãe, me afastei bastante dele, por sentir que tudo o que ele falaria seria mentira. Fiquei mais receosa e desconfiada”, relata.
Apesar dos desafios, ela conseguiu se recuperar emocionalmente com o auxílio da terapia. “Passei a entender que a culpa não era minha e que eu não precisava forçar uma situação onde eu não me sentia confortável”, conclui.
De acordo com a especialista, “os sinais mais comuns incluem a recusa injustificada da criança em conviver com o outro genitor, distorções sobre o caráter desse genitor e uma dependência excessiva do pai ou mãe alienador”, explica Heliodora.
Medidas judiciais e legislação
A advogada especialista em Direito das Famílias, Bárbara Heliodora, enfatiza a gravidade das consequências da alienação parental, alertando que no Brasil, a Lei de Alienação Parental através da lei 12.318/2010, prevê sanções que vão desde advertências até a perda da guarda da criança. “Em casos extremos, o alienador pode ser responsabilizado judicialmente, inclusive com a aplicação de multas”, ressalta Heliodora.
Ela também reforça o papel crucial do advogado de família na proteção dos direitos da criança, explicando que, ao identificar indícios de alienação parental, é fundamental orientar os pais sobre as implicações legais e tomar medidas protetivas. “O foco deve ser garantir que o interesse superior da criança prevaleça, promovendo a convivência saudável entre pais e filhos”, afirma.
Heliodora salienta que, em alguns casos, a intervenção judicial é necessária, mas alerta sobre a importância de evitar o litígio, que pode agravar a situação da criança. Além disso, a advogada aponta que a intervenção judicial pode incluir a aplicação de penalidades ao alienador, a alteração da guarda e até mesmo a suspensão da convivência, além de medidas como sessões de mediação familiar e acompanhamento psicológico.