FOLHAPRESS) – A operação da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) batizada de ‘Adelito’ monitorou um homem que ameaçou dar um tiro na testa de Jair Bolsonaro (PL), sem relação com o autor da facada contra o ex-presidente, Adélio Bispo.
Na última fase da operação que mira a chamada ‘Abin paralela’, a Polícia Federal destacou o nome da ação (Adelito) e afirmou apurar a ‘motivação para a possível investigação paralela ao caso Adélio e outras circunstâncias que indiquem o desvio institucional’.
A suspeita seria de uso da agência para atender a interesses eleitorais de Bolsonaro.
Integrantes da agência afirmam, entretanto, que, diferentemente do que suspeita a PF, o nome foi dado porque o alvo fazia reiteradas ameaças a Bolsonaro e também morava em Juiz de Fora, cidade onde o ex-presidente foi esfaqueado por Adélio em 2018.
Uma planilha à qual a reportagem teve acesso indica que a localização do homem foi pesquisada ao menos 116 vezes de 13 a 27 de abril de 2021. A PF aponta números ligeiramente diferentes: 114 acessos nos mesmos dias e mês, mas um ano antes, em 2020.
Em abril de 2021, o homem publicou um vídeo em que dizia que o sonho dele era matar Bolsonaro. A gravação foi amplamente compartilhada nas redes sociais e motivou a abertura de um inquérito pela PF.
‘Tô vendo aqui agora [na TV] a pala da liberação de armas ou não. Seria ideal mesmo, liberar. Porque eu gostaria de matar o Bolsonaro com a própria arma que ele liberou. Um tiro na testa. Na testa. Meu sonho é matar o Bolsonaro. Eu ainda vou fazer’, disse.
A comparação com Adélio Bispo foi feita, na ocasião, por apoiadores de Bolsonaro e pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente.
‘Outro Adélio? Polícia Federal já instaurou inquérito policial para investigar a ameaça do vagabundo acima’, escreveu Flávio nas redes sociais em 14 de abril de 2021.
Durante o período em que foi monitorado pela Abin, o homem fez uma série de publicações agressivas contra o ex-presidente. Em uma delas, publicou uma montagem em que Bolsonaro aparecia em um caixão. Em outra, escreveu: ‘Se fosse na minha mão, sangrava igual porco’.
A Abin é uma das responsáveis pela segurança de autoridades como o presidente da República e ministros. Uma das principais atribuições da agência, nesse aspecto, é levantar informações de inteligência para a proteção dos envolvidos -como as de potenciais agressores.
Procurada, a Polícia Federal respondeu que não se manifesta sobre investigações em andamento.
Na última fase da operação que mira a chamada ‘Abin paralela’, a PF também indicou mensagens que teriam sido trocadas sobre o caso de Adélio Bispo pelo ex-diretor da agência e hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL), pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro.
Em março de 2022, Ramagem determinou ao policial federal Marcelo Bormevet -cedido pela PF à Abin durante o governo Bolsonaro- que realizasse uma análise dos dados disponíveis. Bormevet está preso preventivamente desde 11 de julho.
‘Bormevet, faça uma análise do caso Adélio. Coisa simples. Como está agora. Em que ponto. Relatório, quebras, etc. Acredito que tenha tudo em fonte aberta. Para hoje à noite. Preciso saber condição dele no sistema prisional, onde está, há quanto tempo, etc. A quebra do tel dos advogados, etc’, ordenou.
Em junho deste ano, a Polícia Federal reiterou que Adélio agiu sozinho no crime e anunciou que a investigação sobre a tentativa de assassinato de Bolsonaro estava encerrada. Três inquéritos da PF concluíram que Adélio agiu sozinho, sem ordem de mandantes ou auxílio de comparsas.
Adélio foi considerado inimputável por transtorno mental, mas está preso na penitenciária de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul. No começo de julho, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) suspendeu a transferência dele para um hospital psiquiátrico de Minas Gerais.
A Abin entrou na mira da PF pela suspeita de que a agência tenha sido usada para ações clandestinas no governo Bolsonaro, sob o comando de Ramagem.
A investigação aponta que a estrutura teria sido usada para blindar os filhos do ex-presidente, atacar a credibilidade do sistema eleitoral e espionar ilegalmente autoridades, como ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e senadores da República.
Apesar disso, servidores reclamam que a maioria das acusações pesa contra policiais federais levados por Ramagem para a agência no governo passado. No mês passado, além de Bormevet, o militar do Exército Giancarlo Rodrigues também foi preso.